sábado, 14 de junho de 2008

Manuel Querino Vida e Obra: a importância do Seminário

No momento em que o debate sobre a implementação de ações de reparação aos afro-descendentes e sua inclusão nos mais variados espaços e esferas da vida social brasileira se configura como uma realidade, o Seminário Manuel Querino: Vida e Obra, tem entre tantos outros o mérito de contribuir para tal debate. Tendo em vista a gama de informações e assuntos que deverão ser abordados nesse evento, sobre a vida de um dos mais destacados e respeitáveis intelectuais negros a quem a Bahia teve a honra de servir de berço, dando-lhe régua e compasso.

Tendo em consideração que Manuel Querino foi, não obstante as grandes dificuldades ao longo de sua vida – desde a infância –, um pensador extremamente produtivo, um outsider no entendimento da formação social do Brasil e sobretudo um indivíduo que acreditava na educação como ferramenta primordial de transformação social.

Nascido no tempo da escravidão – tempo do cativeiro –, órfão de pai e mãe, Manuel Raimundo Querino traçou um caminho aparentemente improvável para um indivíduo negro do período oitocentista (século XIX), mesmo tendo nascido livre. Foi através do seu brilho e consistência intelectual que soube reverter os obstáculos de uma sociedade marcadamente paternalista e patrimonialista, socialmente estratificada e clivada do ponto de vista étnico/racial.

Atualmente, em tempos de discussão sobre inclusão social e a contribuição do negro na formação do povo brasileiro, este santamarense emerge como figura de destaque no rol dos que cumpriram papel relevante na sociedade brasileira (o entendimento de seu ostracismo nos movimentos sociais é, inclusive, uma maneira salutar e intrigante para compreensão de como têm sido encaminhadas seletivamente às discussões acerca dos vultos que representam o povo negro).

A Educação, e a produção intelectual de maneira geral, foi sempre o norte de Manuel Querino. Questões como: a perspectiva afro-brasileira na formação do Brasil; as Artes; a Geometria; a formação dos educadores; a função social do Liceu de Artes e Ofícios; o exercício da docência. Todos esses foram temas nos quais Manuel Querino transitou quer na sua produção intelectual, quer na sua trajetória como indivíduo. Além disso, projetou modelos escolares adaptados ao clima tropical, que foram apresentados ao público durante o Congresso Pedagógico do Rio de Janeiro em 1883. Elementos de Desenho Geométrico e Desenho Linear das Classes Elementares são obras que atestam sua atenção especial com o processo didático-pedagógico, ambas produzidas no período em que Querino lecionou no Liceu de Artes e Ofícios e no Colégio dos Órfãos de São Joaquim (duas instituições freqüentadas pelas classes menos favorecidas).

Através do Seminário Manuel Querino: Vida e Obra, espera-se que seja aberto um debate que permita a problematização em volta deste personagem que incomodou no seu tempo e que parece ainda incomodar nos dias de hoje. A história e o cotidiano social mostram que seletivamente certas referências históricas são resgatadas. Algumas emergem, ao sabor das condições específicas de um determinado período; enquanto outras sistematicamente são submergidas, esquecidas nos desvãos de seu contexto histórico. As evidências fazem crer que Manuel Raimundo Querino tem sido incluído na segunda categoria


Dessa forma, impõe-se a necessidade de trazer Manuel Raimundo Querino para o presente, para a ordem do dia, explorando as potencialidades da sua vultosa obra para o povo baiano. É chegada a hora de trazer Querino de volta para as discussões sobre a formação social da nação brasileira, numa época em que principalmente busca-se evidenciar a real contribuição da cultura africana no ethos nacional. Oportuna será a realização do Seminário sobre a vida e a obra de Manuel Querino, que foi sem favor um dos mais destacados intelectuais baianos e cuja obra e ação estranhamente passam ao largo tanto dos acadêmicos atuais como do conhecimento de parte expressiva dos movimentos e entidades defensoras dos direitos da população afro-descendente, que teimam em homenagear apenas e tão somente aos vultos heróicos de Zumbi, Luiz Gama, Gamgazumba e Luiza Mahin, afora os de relevo internacional como Nelson Mandela, Malcom X, Martin Luther King dentre outros. Esquecendo-se que os heróis de fato revelam-se na luta cotidiana e no exemplo de vida que legam aos contemporâneos e aos pósteros.

--Jaime Nascimento

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