domingo, 26 de abril de 2009

Ensinando racismo (e auto-depreciação) às crianças


Uma criança negra, uma menina, foi chamada de macaco (“mico-leão”) em um gibi de Mauricio de Sousa, por não ter o cabelo liso.

 

         Não podemos aceitar esse tipo de ofensa! Todos devemos escrever para os responsáveis!

 

         Enviamos anexo a história completa com a capa do gibi (Ronaldinho Gaúcho, n°24, Dez/2008 - RG A Deise 01) mas destacamos no primeiro anexo (RG A Deise 00) os principais quadrinhos ofensivos, colocamos abaixo os endereços de email dos responsáveis pelo gibi, para que todos escrevam manifestando o seu repúdio.

 

         O que essa história está ensinando a nossas crianças?

 

         Que mensagem essa história envia para as crianças negras deste país?

 

         Está lhes ensinando a não aceitação de sua própria beleza, está lhes ensinado a terrível mentira de que, para ser aceitas e não serem confundidas com o macaco “mico-leão”, devem estar dentro de um padrão de beleza branco, com o cabelo liso. Essa história está ensinando às crianças negras a não gostarem de si como são, a não terem auto-estima.

 

         E que mensagem essa história envia para as crianças brancas deste país?

 

         Está lhes ensinando desde cedo o racismo, a discriminação, a verem as crianças negras como diferentes, a abominável mentira de que as crianças negras para não serem “confundidas” com um macaco “mico-leão” tem que mudar sua própria aparência.

 

         Iremos permitir que ensinem essas mentiras a nossas crianças?

 

         Deixaremos barato? Faremos de conta que não aconteceu?

 

         Miriam Leitão disse uma vez que se discrimina no Brasil porque é barato discriminar, isto é, não se cobra, não se denúncia, não se faz.

 

         Nosso mais profundo apelo é: DEIXEMOS CARO, deixemos muito caro.

 

         Por favor, vejam, estamos falando de nossas crianças, estamos falando do futuro, do Brasil daqui a 20, 30 anos!

 

         Se permitirmos que ensinem impunemente o racismo a nossas crianças quando iremos nos livrar desse veneno? Nunca!

 

         Temos que fazer nossas vozes serem ouvidas! Temos que dar um basta! Isso é dever de cada um.

 

         Estes são os endereços dos responsáveis:

comercial@hitpublish.com.br

instituto@institutomauriciodesousa.com.br

msp@turmadamonica.com.br

imprensa.panini@litera.com.br

         É muito importante para nós sentirmos que nosso trabalho de denúncia tem dado resultados, por isso pedimos que encaminhem uma cópia oculta para nosso endereço:

ativismonline@gmail.com

 

         Também pedimos que encaminhem essa mensagem àqueles que vocês sabem que também manifestarão o seu repúdio, para que nossos esforços sejam multiplicados, e para aqueles que podem tomar uma providência legal.

 

         Lembramos ainda que, em 17.04.2009, o Jornal Nacional da Globo exibiu uma frase racista de uma cabeleireira. Na matéria sobre Angola, na Africa, ela ao dizer que as angolanas procuravam no salão o que chamavam de “cabelo brasileiro”, explicou que “quando elas estão procurando o cabelo brasileiro, estão procurando o cabelo liso, o famoso cabelo bonito”.

 

         Associando, evidentemente, o cabelo próprio do negro à feiúra, à negatividade, estabelecendo como único padrão de beleza o cabelo liso.

 

         Interessante que a matéria destaca que as angolanas gostam de ver novelas da Globo, já dá para saber de onde elas tiraram que o “cabelo brasileiro”, o “cabelo bonito” é o cabelo liso, deixando de enxergar a beleza de seus próprios cabelos.

 

           um comentário sobre a matéria no site da Afrobras:

http://www2.afrobras.org.br/index.php?option=com_content&task=view&id=484&Itemid=1

         A matéria pode ser vista no seguinte link:

http://video.globo.com/Videos/Player/Noticias/0,,GIM1006190-7823-ANGOLA+TEM+CRESCIMENTO+ECONOMICO+E+POBREZA+EXTREMA,00.html

         É possível deixar comentários na página:

http://especiais.jornalnacional.globo.com/jnespecial/2009/04/17/cenas-do-cotidiano-do-povo-angolano/

         É muito importante que todos nos manifestemos na página acima contra essa frase racista!

         Também é possível enviar mensagens para o Jornal Nacional em:

http://jornalnacional.globo.com/Telejornais/JN/0,,FEF0-10476,00.html

 

          Essas duas manifestações de racismo contra o cabelo dos negros nos lembrou de Malcolm X ao perguntar:

“Quem te ensinou a odiar a textura do seu cabelo? ...”  Vemos que essa pergunta de Malcolm X ainda tem que ser feita hoje! O vídeo pode ser visto no link:

http://www.youtube.com/watch?v=2x8KgPf8Pq0    [~2 min.]

 

         Recomendamos a todos.

 

         Esses fatos também nos lembraram da música “Respeitem meus cabelos brancos” de Chico César.

 

         Confrontemos o racismo, nos calarmos é dar nossa permissão para que isso continue, calar é concordar com o opressor, como nos ensina Jane Elliot no documentário “Olhos Azuis”, que também recomendamos a todos:

http://www.youtube.com/watch?v=o_pS05t7liw

 

         Construamos um Brasil mais justo, confrontemos o racismo!

         Abraços,

Ativismonline – Malaika e Marcelo.

segunda-feira, 20 de abril de 2009

Palestra: Elisée Soumonni, ‘O Brasil na História e Historiografia do Daomé-Benin’, 24 de abril, CEAO, Bahia

Elisée Soumonni, historiador da República do Benin, faz palestra

que abre ciclo de comemorações dos 50 Anos do CEAO

O Centro de Estudos Afro-Orientais, o Programa Multidisciplinar

de Pós-Graduação em Estudos Étnicos e Africanos, e o Programa de

Pós-Graduação em História da UFBa convidam para a palestra do

Prof. Elisée Soumonni, cujo título é ‘O Brasil na História e

Historiografia do Daomé-Benin’, que se realizará no dia 24 de

abril, sexta-feira, às 18:30 horas, no Auditório Milton Santos do

CEAO, no Largo 2 de Julho, Centro.

Elisée Soumonni obteve o seu Diploma de Estudos Superiores na

Sorbonne, Paris, e o seu Ph.D em História da África na

Universidade de Ifé, Nigeria. A sua carreira profissional esteve

dedicada à pesquisa e o ensino, na Nigéria (Ahmadu Bello

University) e no Benin (Université Nationale du Bénin em Abomey-

Calavi). Ele foi Fulbright Research Fellow na Emory University,

Atlanta (1997-1998), Leverhulme Research Fellow na University of

Hull, UK (2001) e Professor Visitante na Universidade Federal

Fluminense, Niteroi, RJ (2003). Ele também foi membro do Comitê

Cientifico Internacional do projeto A Rota dos Escravos da Unesco

entre 1994 e 2004. O foco das suas inúmeras publicações é o Daomé

pré-colonial e os retornados brasileiros na Bahia do Benin

durante século XIX.

É com enorme satisfação que o CEAO e o Posafro estão recebendo

Elisée Soumonni como Professor Visitante no primeiro semestre de

2009 e não poderia haver momento mais oportuno tendo em vista que

estão sendo organizados diversos eventos ao longo do ano

comemorativos do cinqüentenário do CEAO, que poderão contar com a

participação de um intelectual de tão alto nível. Um aspecto que

se destaca na trajetória do CEAO é o pioneirismo na criação de

acordos de cooperação e intercâmbio com universidades africanas

que permitiram o trânsito de pesquisadores entre a Bahia e a

África. Iniciativas nesta direção são atualmente ainda mais

importantes, tendo em vista a relevância crescente do

fortalecimento dos vínculos, não apenas diplomáticos e

econômicos, mas também intelectuais e culturais, entre o Brasil e

os países africanos.

Palestra do Prof. Elisée Soumonni

Título: O Brasil na História e Historiografia do Daomé-Benin

Data: 24/04/09, sexta feira

Hora: 18:30

Local: Centro de Estudos Afro-Orientais.

Largo 2 de Julho, 42, Centro

Fone: 32035501 ceao@ufba.br www.ceao.ufba.br

quarta-feira, 15 de abril de 2009

Em louvor a Mestre Pastinha

Em homenagem à Vicente Joaquim Ferreira Pastinha, o Portal Capoeira exalta o Mestre, propondo a toda comunidade capoeirística o "VIVA PASTINHA".


Um mês dedicado a Vida e Obra deste Grande Homem e Mestre de Capoeira.

Dia 05 de Abril, Mestre Pastinha teria completado 120 anos, se estivesse "fisicamente vivo"...

Vicente Joaquim Ferreira Pastinha, era uma pessoa bem-humorada, descontraída, bastante receptivo, rico em conhecimento, seu saber transcendia as rodas de capoeira.

Mestre Pastinha, era o guardião da capoeira Angola, a Capoeira Mãe... Imortalizou o seu legado e o seu amor incondicional pela Capoeira... Deixou discípulos e seguidores espalhados pelo Mundo...

João Grande, João Pequeno, Gildo Alfinete, Curió, Moraes, Bola Sete, Cobra Mansa, Jogo de Dentro, Janja... e tantos outros grandes Mestres...

A Capoeira Angola, a capoeira tradicional, continua forte, mágica, lúdica, maliciosa...continua encantando e contagiando...

Salve Mestre Pastinha, Salve a Capoeira Angola!!!

Durante o mês de Abril, vamos todos formar uma grande roda de Angola... Vadiar em homenagem ao Mestre e celebrar os 120 anos de sua "Vida pela Capoeira"

Iêêê

... VIVA PASTINHA...


É assim que devemos ver... apesar de não estar neste plano, ele continua vivo, na essência da própria Capoeira!!!

Dica de leitura (Artigos, Matérias e Documentos): "VIVA PASTINHA"

o Manuscritos de Mestre Pastinha.
o Mestre Pastinha (Salvador – 1971) Homenagem de Reyson Gracie
o Pastinha... da Bahia à África - 1966
o A Fascinante Angola... De Pastinha a Moraes
o Ética de Pastinha
o A Herança de Mestre Pastinha
o Cartão Postal "VIVA PASTINHA"
o Capoeira na televisão francesa em 1963
o Documento Histórico: “Capoeira, Brazilian Karate

Novos Downloads

o Olhar Branco em Balaio Negro (24)
o Guia Prático da Nova Ortografia Brasileira - 2009 (206)
o Revista Textos do Brasil - Edição 14 - Capoeira (314)
o A Capoeira na Sociedade do Capital (215)

Próximos Eventos

Abril
o I Fórum de Pesquisa e Prática de Culturas Afrodescedentes -
Abril 08, 2009 (08:00) - Abril 14, 2009
o Festa do Nascimento do Boi Morro do Querosene -
Abril 11, 2009 (08:00)
o 6 Open Brasileiro de Capoeira do Df -
Abril 17, 2009 (Todo dia)
o 6º Open Brasileiro de Capoeira do Distrito Federal -
Abril 18, 2009 (08:00) - Abril 21, 2009
o Curso: Patrocínio Cultural -
Abril 18, 2009 (08:00)
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Um grande abraço a todos,
Luciano Milani

domingo, 12 de abril de 2009

CAMINHOS DE IFÁ


Grupo de Estudos Africanos e Afro-brasileiros de Línguas e Culturas (Geaalc) da UNEB realiza I Ciclos de Palestras 2009 - Evento gratuito convida pesquisador da Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, e professor da Universidade da Nigéria para discutir temas da cultura africana Yorubá - Dias 14 e 15/abril, em Salvador

O Grupo de Estudos Africanos e Afro-brasileiros de Línguas e Culturas (Geaalc), do Departamento de Ciências Humanas (DCH) do Campus I da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), realiza nos dias 14 e 15 de abril o I Ciclos de Palestras 2009.

A programação do evento reserva palestras com início às 16h, no auditório Ivete Sacramento, com sede no DCH do campus, em Salvador. O evento é aberto ao público, que pode se inscrever gratuitamente no dia e local de realização do ciclo. Estão sendo disponibilizadas 40 vagas.

A iniciativa traz à UNEB dois pesquisadores internacionais, que farão exposições sobre a cultura africana. Dia 14 de abril, o professor Olasope Oyelaran, da Universidade Obafemi Awolowo (antiga Universidade de Ifé), da Nigéria, falará sobre o tema O mundo Yorubá: tradição e língua.

No dia seguinte é a vez do americano Victor Manfredi, professor da respeitada Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, que ministrará palestra sobre Os caminhos de Ifá - sistema de adivinhação que se originou entre os yorubás da Nigéria.

Segundo Yeda de Castro, uma das coordenadoras do Geaalc, o ciclo tem o objetivo de discutir a cultura africana através de pesquisas desenvolvidas por especialistas da área. “Nesta oportunidade, estamos trazendo reconhecidas personalidades internacionais com diferentes visões sobre a cultura afro”, destaca.

O próximo ciclo de palestras será realizado no início de junho e já tem confirmada a participação do artista plástico Babatumbe Lawal, que estudou na Universidade de Ifé.

O Ciclo de Palestras 2009 recebe o apoio do DCH e do Programa de Pós-Graduação em Estudos de Linguagens (Ppgel), do Campus I da UNEB.

Informações: Geaalc/Campus I - Tel.: (71) 3117-2448.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

“Não há nada para discutir aqui, se não há racismo no Brasil” - Entrevista com Donn Davis

Professor associado e diretor de Pós-Graduação do Departamento de Ciência Política da Howard University, em visita ao Brasil, participou do painel “Diálogo sobre Racismo no Judiciário”, promovido pelo Ministério da Justiça, e proferiu palestra na Faculdade de Direito da UnB. Davis coloca o enfrentamento ao racismo como ponto norteador do debate sobre igualdade racial e políticas públicas no Brasil

Por Isabel Clavelin*

Donn G. Davis é especialista e pesquisador de direito constitucional, processos legislativos e do judiciário, ideologia política, direito e sociedade afro-americanas, e democracia e direitos humanos em sociedades pós-coloniais. Sua pesquisa atual enfoca questões relativas ao impacto das políticas sociais reparatórias no período posterior ao Movimento pelos Direitos Civis e ao debate atual sobre as ações afirmativas nos EUA, numa perspectiva comparada com o Brasil, Malásia e África do Sul.

Entre 1995 e 2001, Davis foi diretor Legislativo Sênior e Conselheiro do Congressional Black Cáucus - comissão do Congresso dos Estados Unidos que atua para defender os interesses das populações afro-americanas e atuar nas campanhas legislativas pelos direitos humanos e civis. Nesse cargo, desenvolveu pesquisas e análises, redigiu propostas de leis, organizou audiências legislativas, desenvolveu e supervisionou programas de serviços para eleitores.

É autor de três monografias para o Congresso dos Estados Unidos e de cerca de 50 artigos publicados em periódicos especializados, anais de conferências acadêmicas e sob a forma de capítulos de livros. Recebeu diversos prêmios e distinções. Atualmente, dedica-se a dois livros em fase de edição: American Political Leadership, Ideology, Culture and Recent History” e “Equalizing the Global Playing Field: A Comparative Assessment of Affirmative Action in Brazil, Malaysia, South Africa and the United States”.

Donn Davis concedeu uma fascinante entrevista ao Ìrohìn, na Faculdade de Direito da UnB (Universidade de Brasília) na semana passada antes de sua palestra “O Racismo no Judiciário: A Experiência dos Estados Unidos”. Esse foi o último compromisso de Davis no Brasil, cuja missão começou no dia 26 de março no painel “Diálogo sobre Racismo no Judiciário”, promovido pelo Ministério da Justiça.

Na entrevista, Donn Davis aponta questões centrais para o Brasil e a militância negra: a atuação do Estado brasileiro para o enfrentamento ao racismo e a efetivação do princípio constitucional da igualdade e a autonomia do movimento social para manter o engajamento e a crítica necessária contra o sistema que impede os direitos de cidadania da população negra. Davis ressaltou a baixa representatividade de negros e negras nos espaços de poder, particularmente no Judiciário, e o falacioso uso da igualdade como subterfúgio argumentativo para recusa das cotas e das políticas de ações afirmativas.

Mais entusiasmado do que na primeira visita ao Brasil, ocorrida em 2002, Davis constatou um avanço no debate sobre racismo e discriminação racial no país. E declarou “orgulho da embaixada dos Estados Unidos Foto: Tana Cardosopor se aproximar das organizações sociais brasileiras. Isso é algo que enche o meu coração de orgulho”.

Ìrohìn - Qual o impacto das políticas reparatórias e de ações afirmativas pós-Direitos Civis nos Estados Unidos? Como o senhor avalia o resultado dessas políticas? O presidente Obama é resultado dessas políticas?

Donn Davis - Em primeiro lugar, quero agradecer o convite para estar aqui. Estou muito grato pelo convite e satisfeito de saber do interesse do Ìrohìn e de seu ponto de vista. Estou disposto a compartilhar com seus leitores. Fico feliz em saber da existência do Ìrohìn e vou tentar acompanhar a versão on line do jornal. Fico gratificado em ver que o fato de estar aqui é o início daquilo que vejo como um movimento emergente e crescente no Brasil, que reflete o desenvolvimento de uma consciência mais intensa do que pude ver durante minha primeira visita, em 2002. Quando vim para o Brasil, pela primeira vez, percebi a necessidade de um movimento de massa que levantaria a questão do racismo e a necessidade de o Estado brasileiro levar a sério as condições de emergência dos diferentes grupos étnico-raciais do país por meio do desenvolvimento de políticas de ações afirmativas com resultados. Isso levaria a um alívio de certas condições de negação que eu havia percebido na minha primeira visita. Mas fiquei muito desencorajado naquela época, porque eu achava que o Brasil poderia fazer uso do movimento de massa, como tivemos nos Estados Unidos, e não estava fazendo.

Ìrohìn - Que diferenças o senhor percebe entre Brasil e Estados Unidos, partindo da perspectiva do combate ao racismo?

Donn Davis - Seria extremamente difícil, talvez até impossível, fazer isso aqui no Brasil por causa da mistura, digamos, de identidades nesse País, das quatro divisões principais que se tem na população. Isso deixa as pessoas com uma capacidade reduzida para descobrir uma consciência negra intensa, o que levou ao desenvolvimento do nosso movimento de massa nos Estados Unidos. Eu acho que isso tem a ver com a nossa luta dos Estados Unidos que nasceu de uma condição de segregação absoluta. Não havia qualquer possibilidade de se imaginar outra opção que não fosse a de lutar contra o sistema que a segregação estadunidense, durante toda a primeira metade do século XX e o último quatro de século XIX, fez numa construção social que beirava o absurdo. Você não podia dizer sou moreno ou sou pardo. Era um sistema que confinava os grupos populacionais. Criava condições para que não houvesse outra alternativa a não ser lutar contra o sistema. O que percebi no Brasil foi uma situação em que muitos indivíduos, pelo menos eu imaginava, tinham a oportunidade de participar de uma luta porque a condição na qual a população não-branca se encontrava era horrível. As pessoas podiam imaginar que se podia ter uma mobilização da sociedade para abandonar essa situação.

Ìrohìn - O enfrentamento do racismo nos Estados Unidos decorreu do racismo explícito pela legislação e pelas relações sociais entre negros e brancos?

Donn Davis - Os Estados Unidos não tinham essa possibilidade de fugir da segregação, você apenas podia lutar contra o racismo. Nós tivemos uma definição racial e restrições legais de raça que expressamente diziam “se tiver uma gota de sangue negro - não interessa quão branco possa ser-, você é negro”. E não havia qualquer nível ou qualquer espécie de contestação daquela condição. Então, você tinha apenas a possibilidade de lutar.

Ìrohìn - Como se dá o debate racial hoje nos Estados Unidos? A eleição do presidente Obama trouxe o tema à tona?

Donn Davis – A eleição de Obama é um encorajamento para muitos de nós. Temos muito orgulho de que um homem negro seja finalmente eleito para a presidência dos Estados Unidos. Mas não temos uma expectativa exagerada da gestão de Barack Obama. Uma das coisas que tem aparecido como resultado de nossa luta é a composição de ativistas sociais e políticos, eleitos ou que passaram a integrar a gestão do presidente Obama em cargos. Isso é bom por um lado, mas é ruim de outro lado porque uma vez que você se torna prefeito, senador ,ou tenha qualquer posto no governo sua atuação, fica muito restrita. Obama não pode agora representar os interesses dos negros. Ele é presidente dos Estados Unidos. A sua campanha à presidência, propositalmente, eliminou qualquer menção à raça. Exceto numa ocasião em que ele teve de falar sobre raça. Foi um esforço calculado não falar sobre raça, porque ele não era um elemento de sucesso no seu caminho à presidência. A política prática diz que ele estava correto. Mas como presidente dos Estados Unidos ele não pode liderar a atividade de protesto. Não pode ser porta-voz dos negros, das ações afirmativas, de reservas de oportunidade de emprego. Deve ser presidente de todos os 300 milhões de pessoas dos Estados Unidos. Conseguiu eleger 46 membros do Congresso, cada qual agora é membro do Congresso dos Estados Unidos representando os interesses de um distrito, de um grupo de líderes. Mas eles não têm a liberdade de representar toda a América negra, não têm mais essa possibilidade. Por outro lado, quando não se é eleito ou não se ocupa um cargo, a pessoa tem liberdade de fazer demandas ao Estado, de protestar, de liderar, de criticar e de fazer comentários. Em geral, se está livre para se engajar contra o sistema de uma forma ativa.

Foto: Tana CardosoÌrohìn - Como o senhor avalia a trajetória de Barack Obama?

Donn Davis - A imagem de Obama é exaltada mais do aspecto da percepção. Temos orgulho do fato de ele ocupar a presidência. Gostamos da sua mulher que é negra e adoramos suas duas filhas, que são negras. Incentivo meus alunos para que leiam os dois livros de Barack Obama. Aí eles podem ver o quanto ele parece conosco, mas ele não é um de nós. Ele é produto de uma experiência pública, uma experiência política. Sua mãe era branca da classe média estadunidense, de Kansas, do centro do País. E o pai, um queniano. A formação de Obama foi entre Havaí, Indonésia e, até um certo ponto, nos Estados Unidos. Então há um ponto aí que ele conhece a condição negra, porque é tratado como uma pessoa negra. É visto como uma pessoa negra. Mas na sua própria consciência, ele não é um homem negro de Alabama, Carolina do Sul, Texas, Geórgia ou Califórnia. A experiência dele é qualitativamente diferente.

Írohìn – De que forma os ativistas negros consideram o fato de Barack Obama ser o primeiro presidente negro dos Estados Unidos?

Donn Davis - Temos de lembrar que temos muito orgulho da sua eleição e da sua posição, mas uma distinção que tem de ser feita. Há certas coisas que não podemos esperar dele. Temos orgulho, mas ao mesmo tempo temos de não exagerar o orgulho da sua eleição. A realidade é que há certas coisas que Obama não pode fazer. Quando foi senador, ele poderia ter feito mais para a comunidade negra do que como presidente. Na condição de senador havia também limitações, mas como presidente ele não pode. É individualizar um grupo na população. Ficamos gratificados com sua eleição. Mas alguns de nós percebemos os limites das expectativas. Pode ser que um dia tenhamos de protestar contra Obama, porque ele é presidente. Mas há questões em que se precisa de liderança presidencial. Obama é um presidente progressista. Esteve a favor da escolha das mulheres do direito de decidir pelo aborto, a favor das ações afirmativas. Mantém uma visão social progressista. Esperamos que seja um líder de grande valor para a comunidade negra. Mas, independentemente de mim e de você, ele não pode fazer isso diretamente.

Ìrohìn – Uma pergunta agora no contexto da sua missão. No Brasil, a igualdade é um princípio constitucional. Entretanto, a efetivação da igualdade e o enfrentamento ao racismo se deparam com mais barreiras para a elaboração e execução de políticas públicas do que com a sociedade. Essa situação é perceptível nas três esferas de poder: Legislativo, Judiciário e Executivo. Como especialista na área, qual sua impressão sobre isso?

Donn Davis – Existem muitas garantias na Constituição brasileira, o que falta é implementação. Percebi, na fala de um juiz, um dos motivos pelos quais as garantias constitucionais não são implementadas no Brasil. Vim para essa conferência [Diálogo sobre Racismo no Judiciário”, promovido pelo Ministério da Justiça] porque fui convidado. Mas não há nada para discutir aqui, se não há racismo no Brasil. Aquela é uma pessoa que está num estado de alta negação diante da realidade empírica que conhecemos. Sei que o Judiciário tem apenas 1,7% de juízes afro-brasileiros. Uma coisa que fazemos nos Estados Unidos é que temos eleição de juízes para determinar as pessoas que vão ocupar os postos. Isso faz com que vários líderes e autoridades políticas – prefeitos, governadores, conselheiros municipais e outros -, constituam comissões de cinco pessoas de determinada localidade e três de outros lugares. O grupo analisa a qualificação antes de a pessoa ser designada para o Judiciário. A comissão faz um esforço especial para fazer designações qualificadas e que representem os grupos populacionais. Obama fez duas designações essa semana [semana passada, quando ocorreu a entrevista]: uma mulher latina e um homem asiático porque eles não eram representados no Judiciário quando as designações foram feitas. Mas não queremos ver esse processo de sacrificar a excelência de duas pessoas como essas. Já tivemos listas de pessoas com nível de excelência, mas não postuladas no nosso Judiciário superior. A mesma coisa acontece com o distrito – capital do país (Washington D.C). O presidente dos Estados Unidos faz as designações, mas antes ele conversa com as autoridades locais e a comissão local para ter certeza de que esteja nomeando pessoas extremamente dedicadas. Um dos fatores de sua decisão está baseado na necessidade de manter o nível de competência daquelas pessoas que vão fazer os julgamentos. Isso confere confiança ao sistema, porque a pessoa tem o poder de julgar quem é culpado ou inocente. É preciso lembrar que essa pessoa tem posicionamentos próprios diante de determinada situação.

Írohìn – Como o senhor, especialista da área de ciências política e jurídica, avalia o Judiciário brasileiro no que se refere à questão racial?

Donn Davis – Em minha opinião, o Judiciário brasileiro vai ter decisões mais justas quando a escolha dos juízes refletir a representatividade da população. Estou muito encorajado pelo que vi do Brasil de 2002 para hoje [2009, sua segunda visita ao país]. Fiquei extremamente gratificado por ver isso e estou muito satisfeito. Sinto-me entusiasmado, porque houve progresso. Na minha primeira visita ao Brasil, achei que os brasileiros eram absolutamente relutantes, não queriam nem conversar sobre o assunto. Hoje, vejo que o movimento de consciência negra está se desenvolvendo e as organizações se fortalecem para discutir essa questão e exigir do Estado brasileiro o reconhecimento da violência racial e a existência de discriminação. E reconhecer, acima de tudo, a necessidade de criar políticas e circunstâncias das quais o governo faça o que é necessário para avançar o atendimento daqueles segmentos da população que foram excluídos. A pessoa que diz que não existe racismo e discriminação é a mesma pessoa que está preocupada em dizer que não precisa de cota. Mas eu digo que existe uma cota desde 1850 e a cota para negros desde então era zero.

*Jornalista, mestranda em Comunicação(UnB)
Fotos: Tana Cardoso

fonte: www.irohin.org.br