terça-feira, 18 de março de 2008

Abdias do Nascimento e o "ilustre desconhecido"


Ontem, tive a honra de presenciar um evento histórico - Abdias do Nascimento recebeu um Doutorado Honoris Causa pela Universidade Estadual da Bahia - UNEB. O grande guerreiro, já com 94 anos e sentado numa cadeira de rodas, cumprimentou a plateia com punho erguido, a saudação Black Power. Foi emocionante. Só que, quando os palestrantes (entre eles, o governador da Bahia) citaram os ilustres afro-brasileiros do passado que se comparam com o honrado professor, dramaturgo, autor, artista plástico, político e militante negro, entre eles, Zumbi e Luiz Gama, ninguem lembrou de Manuel Querino. Pelo visto, este continua sendo um "ilustre desconhecido" na sua própria terra.

Em homenagem ao Prof. Dr. Abdias do Nascimento, citamos as palavras de Florestan Fernandes, no prefácio do livro O genocídio do negro brasileiro - Processo de um racismo mascarado:

"Ele não pede 'as migalhas do banquete' e tampouco perde tempo com a 'questão da justiça à gente negra'. Isso ficou para o passado, para as agitações e os movimentos das décadas de 30 e 40[....] Limpa e claramente, retoma a ação direta dos quilombolas, centrando suas baterias na luta pela liberação do negro e do mulato de tantas e tão variadas servidões visíveis e invisíveis".

Visite o website oficial de Abdias do Nascimento

segunda-feira, 10 de março de 2008

Mais notícias de Minas: Religiosas discriminadas na CEF

O CENARAB E DEMAIS ENTIDADES DO MOVIMENTO NEGRO ENTRARAM NA PROMOTORIA DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS COM REPRESENTAÇÃO CONTRA A CEF E A AGÊNCIA ALÍPIO DE MELO. A PROMOTORA ACATOU A DENÚNCIA. ESPERAMOS QUE ESTE FATO NÃO CAIA NO ESQUECIMENTO E QUE OS INTOLERANTES E PRECONCEITUOSOS SEJAM EXEMPLARMENTE PUNIDOS. QUEREMOS QUE A CEF PARA ALÉM DA RESPONSABILIZAÇÃO COM OS FATOS, SEJA LEVADA A IMPLEMENTAR UMA POLÍTICA ANTI RACISTA E ANTI INTOLERANTE EM SUAS AGÊNCIAS, ALÉM DE CAMPANHAS INSTITUCIONAIS QUE LEVE EM CONSIDERAÇÃO A DIVERSIDADE E A PLURALIDADE DE NOSSA SOCIEDADE. O CENARAB E AS ENTIDADES SIGNATÁRIAS DA REPRESENTAÇÃO ACREDITAM QUE A PUNIÇÃO PELA PUNIÇÃO, NÃO TRANSFORMA.

SEGUE O TEXTO DA REPRESENTAÇÃO:

Belo Horizonte, 28 de Fevereiro de 2008. À PROMOTORIA DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS ATT. DRA. JANAÍNA – PROMOTORA Prezada Senhora, O Centro Nacional de Africanidade e Resistência Afro-brasileiro – CENARAB, entidade do movimento social negro que lida com a tradição de matriz africana neste estado e país e demais entidades que subscrevem a presente representação vem respeitosamente solicitar desta PROMOTORIA DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS, que seja instalada processo de investigação e apuração sobre fato ocorrido entre a ASSOCIAÇÃO DA RESISTÊNCIA CULTURAL AFRO-BRASILEIRA JACUTÁ DE IANSÃ – ARCA BRASILEIRA e o GERENTE DE RELACIONAMENTO DA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - AGÊNCIA ALÍPIO DE MELO, NO BAIRRO INCONFIDÊNCIA, Sr. RENATO CÁSSIO ANTUNES, conforme dados abaixo, pelo fato de o mesmo ter incorrido em crime de Constrangimento Ilegal para com a representante da Associação supra citada, no dia 27 de Fevereiro de 2007. Pedimos ainda que comprovado o ato criminoso constante desta denúncia, esta Promotoria de Defesa dos Direitos Humanos com base em suas atribuições e seguindo os preceitos da legalidade tome as necessárias medidas e providências legais, preservando e defendendo os direitos constitucionais das comunidades tradicionais de matriz africana e suas representações legalmente constituídas. Salientamos que para o CENARAB, a diretoria da ASSOCIAÇÃO DA RESISTÊNCIA CULTURAL AFRO-BRASILEIRA JACUTÁ DE IANSÃ – ARCA BRASILEIRA e conjunto de entidades negras que subscrevem a presente representação, este fato em si, não é um fato isolado, nem mesmo reflete apenas a ignorância, a intolerância religiosa e a discriminação de um funcionário da Caixa Econômica Federal, no caso aqui em tela o Sr. Renato Cássio Antunes, mas a realidade brasileira de milhões de negras e negros que têm cotidianamente seus direitos constitucionais desrespeitados. Reivindicamos, portanto, que a Direção da Caixa Econômica Federal seja citada neste processo como co-autora de ato de Constrangimento Ilegal, por ser a mesma responsável pelo quadro funcional que dispõe e ter sido inclusive citada pelo referido gerente quando o mesmo faz referência a negativa de abertura da Conta Corrente Pessoa Jurídica da Associação, como sendo uma deliberação do Conselho da referida instituição financeira. DOS FATOS Na última Quarta-feira, dia 27 de fevereiro, às 12h30min, sob a alegação de que não interessava à Caixa Econômica Federal "ter este tipo de cliente", o Gerente de Relacionamento da CEF – Agência Abílio Machado, em Belo Horizonte, Sr. Renato Cássio Antunes, colocou fim a uma espera de 04 meses para a abertura de uma Conta Bancária Pessoa Jurídica para a ASSOCIAÇÃO DA RESISTÊNCIA CULTURAL AFRO-BRASILEIRA JACUTÁ DE IANSÃ – ARCA BRASILEIRA, inscrita no CNPJ sob o número 00.764.245/0001-95, entidade reconhecida como Utilidade Pública Municipal Lei 9.347/07 e Filiada ao CENARAB. Em Outubro/07, a presidente da Associação, Sra Maria de Fátima Nogueira Souza, Comunicadora Social, portadora do CPF 600.706.336-49 e da Carteira de Identidade M.1.168.524 expedida pela SSP/MG, residente e domiciliada à Rua Aroeira neves, 151 – Bairro Álvaro Camargo, BH, que também atende pelo título sacerdotal de Mame'tu de Inkissi Kitaloiá solicitou a abertura de uma conta bancária pessoa jurídica, na Caixa Econômica Federal na agência Abílio Machado visando atender exigência do governo federal para assinatura de convênio. Após apresentar toda a documentação necessária e inúmeros telefonemas sem obter uma resposta à solicitação, a Sra Presidente, Mame'tu de Inkissi Kitaloiá procurou a Coordenação do CENARAB para expor o problema. Ontem telefonamos novamente para o gerente de quem cobramos uma resposta à solicitação, sendo que o mesmo solicitou a presença da Senhora Presidente a Mame'tu Kitaloiá na agência para que a resposta lhe fosse dada. Eu Célia Gonçalves Souza, Jornalista, portadora do CPF 681.601.356-53 e da Carteira de identidade MG 3.230.534 expedida pela SSP/MG, residente e domiciliada nesta capital à Rua Conceição Teodoro, 53, Bairro Nazaré, a acompanhei até a agência, quando para nossa surpresa a resposta dada pelo gerente foi a de que "O conselho da agência após analisar a solicitação indeferiu o pedido da Associação, oferecendo a mesma apenas a possibilidade de abertura de uma conta poupança", imediatamente indaguei ao mesmo qual foi a base para esta resposta, visto ser a Associação uma entidade registrada e inscrita no Conselho Nacional de Pessoas Jurídicas e se encontrar em dia com sua documentação e obrigações. A resposta dada foi a de que "assim como a senhora escolhe um banco para sua movimentação bancária, o banco escolhe o cliente com o qual deseja trabalhar. E neste caso a Caixa Econômica não se interessa por este tipo de cliente". Perguntei ainda ao Sr. Renato se a motivação para esta postura, era pelo fato da Associação se tratar de um candomblé, ao que ele respondeu que "a Caixa Econômica se sentia no direito de ter o cliente que lhe interessava, e que se quiséssemos o Conselho havia definido pela Conta Poupança". Não adiantou os argumentos de que a CEF era um banco público e que não cabia ali este tipo de atitude, que a Associação é pessoa jurídica com direitos e deveres, sendo que se encontra em dia com estes últimos. E que esta era uma exigência dos órgãos governamentais para a realização de convênios e repasse de recursos públicos. Por fim, o gerente pegou os documentos que repousavam em sua mesa há mais de 04 meses e tentou nos devolver, despachando-nos literalmente de sua sala. Não aceitamos a documentação, ao que ele respondeu que esta de nada valia, pois não havia nenhuma prova que a solicitação havia sido feita, pois não tínhamos protocolo. Respondi ao mesmo que então a jogasse no lixo, pois, eu testemunharia a favor da Associação. Após a humilhação e execração pública, pois era horário de almoço e a agência se encontrava cheia, nos retiramos dali e procuramos orientação no batalhão da PM mais próximo. Recebemos a orientação de procurar o Distrito Policial (civil), onde deveríamos registrar um BO por Constrangimento Ilegal, o que fizemos no 14º DP. Na ocasião fomos acompanhadas por membros do CENARAB e da Sra. Cleide Hilda e Ed Carlos, respectivamente presidente da Fundação Centro de Referência da Cultura Negra e colaborador. Sabemos que em outras agências talvez seja mais tranqüilo abrir esta Conta Corrente, mas não queremos fingir que não existe um problema e um ato de discriminação e de flagrante desrespeito à Constituição Brasileira, que nos assegura direitos iguais. Queremos e exigiremos a punição do funcionário público, que demonstrou sua incapacidade profissional e seu preconceito; a posição da direção da CEF; além é claro, da abertura da conta corrente naquela agência. Não podemos nos impor a Lei do silêncio e do medo da exposição pública de uma das maiores feridas de nossa sociedade a intolerância religiosa contra a tradição e expressões de matriz africana. Sabemos que fatos como estes não são exceções e que calar e fingir que nada aconteceu só reforçará a impunidade e a arbitrariedade. Por isso, solicitamos desta Promotoria de Defesa dos Direitos Humanos a averiguação e responsabilização dos fatos aqui narrados. ASSINAM A PRESENTE REPRESENTAÇÃO AS SEGUINTES ENTIDADES: Centro Nacional de Africanidade e Resistência Afro-brasileiro - CENARAB Associação da Resistência Cultural Afro-Brasileira Jacutá de Iansã – Arca Brasileira Fundação Centro de Referência da Cultura Negra - FCRCN Coordenação Nacional das Entidades Negras – CONEN União de Negros pela Igualdade Racial - UNEGRO Movimento Negro Unificado - MNU Federação Espírita Umbandista de Minas Gerais Coletivo de Empresários e Empreendedores Afro-brasileiros - CEABRA – MINAS Movimento de Capoeiras de BH Movimento de Mulheres Negras GRUCON

Intolerância Religiosa em Minas - Lembrando o Século XIX

Mais um ato de intolerância religiosa em BH/MG

No dia 14 de fevereiro por volta das 9:00hs. à r. "D", 33 bairro Bernardo Monteiro, município de Contagem, chegaram 2 indivíduos à paisana em nosso templo sagrado. Se dizendo policiais, e empunhando um revólver cada um, adentraram o recinto alegando que estavam na captura de dois ladrões que assaltaram o supermercado SUPERBOX.

Vasculharam toda a casa chegando até à "Camarinha" (local sagrado de reclusão durante o período de iniciação, cuja entrada só é permitida aos iniciados no culto de Candomblé). Sob protesto do Babalorixa Wagner de Oxum, os mesmos invadiram a Camarinha, onde se encontravam quatro pessoas "recolhidas," citadas a seguir: Alef Henrique Borges (12 anos), Maximiliano Soares Silva (28 anos), Nelson Wagner Borges
Soares(23 anos), Maria Moreira da Silva( 53 anos). Em seguida, um dos policiais indagou sobre um menor que estava ali recolhido,e apontando o dedo perguntou o nome e a idade de cada um.

Outros questionamentos aconteceram, inclusive um muito desrespeitoso, que foi se ali estava acontecendo algum tipo de relação sexual. Neste momento um dos policiais dizendo ser o sargento Wagner exclamou a seguinte frase: "Viemos procurar uma coisa e encontramos outra!" Indagou também se o menor Alef tinha a autorização dos pais para estar ali, ao que o Babalorixa wagner prontamente respondeu que sim.

Após estes acontecimentos, se retiraram, e mais tarde, por volta das 17:30 hs, retornaram acompanhado de dois policiais militares, devidamente fardados e em viatura apropriada da PM, portando um documento, o qual dizia ser um mandado da vara de Infância e da Juventude, expedido pelo Juiz Dr. Paulo Rogério de Souza Abrante. Na mão do sargento Wagner, se encontrava uma arma e na mão do seu parceiro uma filmadora ligada, que também sob o protesto de todos os religiosos ali presentes, executou a filmagem de forma autoritária e abusiva.

Em seguida, conduziram o menor, a sua mãe e sua tia para a viatura policial, e daí levaram todos à presença do Juiz. Vale dizer que a condução do menor na viatura policial também aconteceu sob protesto do Babalorixa Wagner, uma vez que o menor se encontrava no período de iniciação, e portanto a viatura era inapropriada para aquela ocasião, e sendo assim, lhe foi oferecido outra alternativa de transporte, a qual não foi aceita pelos policiais.

Chegando na presença do Juiz, a primeira indagação do mesmo foi se o menor estava sendo forçado ou coagido a passar pelo processo iniciático, e Alef respondeu que estava alí de livre e espontânea vontade, e mais que isso, com apoio de toda família.

O juiz indagou ainda sobre a pratica ocorrida no ritual, enfatizando "o banho de sangue", ao que o Alef respondeu que o banho não era de "sangue", e sim de ervas apropriadas.

Em seguida chamou a mãe do menor em particular, e disse à mesma que a religião é escolha de cada um, como reza a constituição brasileira, contanto que o menor não faltasse às aulas. Encerrado mais este episódio, os acusados retornaram ao terreiro de candomblé, de táxi!

Salientamos ainda, que a TV Record esteve presente no terreiro de Candomblé também no mesmo dia, através de um repórter, que de acordo com o mesmo foi convocado pela PM para obter a versão do mesmo fato através das vitimas. A este repórter foi somente reservada a filmagem da área externa do terreiro de Candomblé, não sendo permitida a sua entrada.

No dia seguinte para a surpresa e indignação de todos, a TV Record exibiu em seu programa "Balanço geral", através do repórter Carlos Viana, imagens filmadas pelo policial citado no inicio deste relatório, em cuja matéria falava-se em cárcere privado, culto de magia negra, ritual macabro e sacrifício humano. Vale lembrar que as imagens exibidas se referiam ao interior do recinto.

Uma outra matéria sobre este fato também foi exibida pela radio Itatiaia na mesma data.

O Monabantu/MG está tomando as devidas providencias contra este fato, mais um ato de desrespeito aos religiosos de matriz africana.


Tania Cristina
-Estilista-afro/Mestra em Indumentária Africana
-Educadora Social./Artesã
-Fórum Agenda 21 do Estado de Minas Gerais Grupo GTT-03
-Monabantu/MG -Coordenação Executiva Estadual e Comunicação